terça-feira, 17 de setembro de 2013

Altar ao deus Fracasso

O vento que uiva entre as frestas de tuas janelas
te vaia pelas derrotas acumuladas.
Sentes o gosto amargo do fracasso
em todas atividades que julgastes dominar.

Teus olhos se fecham insistentemente enquanto trabalhas
miseravelmente para morar de forma miserável.
Almoças o que teu dinheiro compra.
Vendes mãos, pernas e cabeça para empresas que riem de tuas palavras
e soterram tuas ambições.

Pintas de palhaço teu rosto.
Abraças a ordem irracional e doentia da sociedade
já que não podes revertê-la durante os momentos
em que deslizas débil e fraco por ruas esburacadas.

Materializas armas de fogo imaginárias
para erradicar a fome, o choro, o frio.
Permites que sejas um pedaço sonolento de carne
fatiado, frito e devorado pelos poderosos carnívoros
que degustam, digerem e defecam toda e qualquer sobra de alma
nos resquícios de planeta respirante.

Te arrependes do passado como mãe que torcia a feição para a filha
mendigando abraços em frente a escola, aos seis anos de idade
e agora, de cama, sente o corpo quente de sua primogênita ao receber o afago sincero.

Sentes medo, angústia, temor e raiva.
Vês que os olhares desconhecidos evitam os teus,
como evitas os dos moradores de rua, que exalam carência e suplicam
por um ouvido que os ouça.
Sentes que tens mais para ofertar, antes de entregar-se à comunhão dos anjos.

Mas sabes que não crias novidade alguma.
Só choras, ri, se revolta como tantos outros já fizeram antes.
E a mão pesada da realidade atinge teu estômago
para que te curves, eternamente, àquele que rege a vida dos vivos,
condena à morte os que não estão mortos e repreende os mortos-vivos.
Àquele que passeia nos jardins dos transeuntes
cheirando a expectativa não tocada, inexpressiva e desamparada.

Fizestes da tua vida um altar ao deus Fracasso.