domingo, 25 de agosto de 2013

No dia em que nasceu

Um aglomerado de gente olha para o fim do horizonte
crendo que ali, onde a terra toca o restante do universo
seu zé descansaria o corpo curvado e ressecado.
Os passos secos na rua de terra ecoavam nos ouvidos dos vivos e dos mortos.
Range como quem grita a dor da perda o portão de ferro enferrujado.
Cochicha baixinho a brisa do verão.
A vela se desmancha, chorosa, na mão da mulher
que lidera a multidão solenemente curiosa.
Eles não veem a escuridão do dia,
apesar do sol quente que envermelha suas cabeças.
Não há pedra sobre pedra,
nem pedra sobre coisa alguma.
Há sim um silêncio pesado,
como a pressão nos pulmões de quem mergulha, de súbito, na piscina da morte.

Como pode a vida acabar-se dentro de uma caixa?

A vida é como um cachorro
que, cansado de brincar com um pedaço de osso, cava um buraco, o põe lá dentro
e tapa cuidadosamente.
Tem-se aqui um bolo de aniversário
de terra e velas que cobrem o pobre zé.
Pobre zé.
Nem sempre quem morre é porque um dia já viveu.

Eternamente fechados, seus olhos não verão o pranto dos que permanecem deste lado.
Não vêem o menino, curioso, espiando o rito
entre uma fresta generosamente aberta no murinho do cemitério.
mas se zé pudesse ver (e ouvir e pensar),
diria, como disse certa vez o músico
“como pode alguém morrer no mesmo dia em que nasceu?”

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